Por Susana Valentim
Um lugar na terra chamado Indonésia…
A Indonésia é um país complexo para os europeus. A minha experiência em Jacarta é a do europeu típico que, pela primeira vez no país, tem de se desprender das ideias e esquemas da vida europeia, à força. Na Indonésia, nada é o que parece e não é possível esperar o que é de esperar na própria Europa. Também não existe programa de futuro, vive-se só o presente e o daily life. Mas vamos por partes.
Em primeiro lugar, o que choca ao europeu com efeitos bombásticos após a aterragem éo tráfego.
O pior tráfego no mundo encontra-se em Jacarta. Num país com 250 milhões de habitantes e numa ilha com 90 milhões, -a mais populosa do mundo -, faz com que exista um ritmo implacável de carros -Toyota- e de motocicletas -Honda- a passar a toda hora. São milhares, em qualquer lugar a toda hora. Não há horas de ponta. Simplesmente, a hora ponta é sempre. O espaço público é diminuto e os direitos do pedestre são exíguos. Há semáforos e passadeiras, sim, mas pouco importa. Para atravessar uma rua, eu tenho do pedir aos carros que passam à minha frente, acenando com a mão. Às vezes, tenho sorte e o condutor é simpático. “Parece europeu! Onde é que ele tirou a carta de conduzir?” Digo a mim própria toda divertida. Por outro lado, os transportes públicos são escassos e de má qualidade. É por isso que há altos níveis de poluição e o ar torna-se muito contaminado na cidade. Convém sempre viajar de carro particular, em vez de caminhar, ou, caso contrário, usar sempre uma máscara. Não é uma cidade em que encaixe o conceito de “passear” que é tão normal na Europa. Em Jakarta, simplesmente não se caminha. Não só pelo tráfego e poluição, mas também pelo calor e humidade constantes a qualquer hora.
Em segundo lugar, passado algumas horas logo após a aterragem e a meio de uma sesta reparadora após uma viagem de avião de vinte horas, ouve-se a chamada à oração desde várias mesquitas. Jacarta está cheia de mesquitas.
É impossível evitá-las. Habituamo-nos a viver com elas passados algum tempo. A maior mesquita do sudeste da Ásia encontra-se precisamente em Jacarta, a chamada Mesquita Istiqlal, mesmo em frente da Catedral de estilo neogótico que os holandeses ergueram durante a época da ocupação em 1901, a chamada Catedral da Assunção. Este facto chama muito a atenção, porque uma está justo em frente da outra. A mesquita concretamente foi mandada construir em 1961 pelo Presidente Sukarno e completada e inaugurada pelo Presidente Suharto em 1978, ou seja, dezassete anos mais tarde. Precisamente, o facto de ambas as religiões coexistirem, mesmo em conjunto com outras religiões tais como a budista ou a hindu, é um dos principais atrativos da Indonésia.
A coexistência harmoniosa entre todas as religiões é outro dos pontos que eu destacaria desde a minha experiência. A Pancasila, que literalmente significa “os cinco princípios fundamentais a respeitar” é a filosofia que impregna a fundação do Estado indonésio e que foi promovida pelo presidente Sukarno em 1945, com o intuito de unificar as ilhas do país. Cabe relembrar que a Indonésia tem cerca de 17.000 ilhas, com sociedades e culturas totalmente diferentes, pelo que a dita filosofia foi necessária para a criação da nação. Por exemplo, a ilha de Java, onde a cidade de Jakarta se localiza, é de maioria muçulmana, a de Bali hindu e a das Flores católica.
Em terceiro lugar, as paisagens naturais são outro atrativo da Indonésia. As ilhas que já tive oportunidade de visitar, para além da da Java, foram as de Bali e de Lombok, as quais contêm paisagens exóticas e paradisíacas que tiram o fôlego a qualquer um que as contempla. O pôr de sol, em especial, sobre o mar é espactacular, mostrando uma palette de cores azul, turquesa e tons laranja. A ilha de Bali, em concreto, é uma combinação amigável e atraente de incríveis praias e florestas com templos hindus majestosos. Ao passo que a ilha de Lombok é ainda mais selvagem, mais calma e menos explorada turisticamente, mas igualmente bela. A cidade de Yogyakarta, na ilha de Java, é igualmente linda, mais arranjada e limpa do que Jakarta e com um património hindu e budista nos arredores da cidade, no qual se destaca o templo do Borobudur – uma alusão à vida de Buda- e o Prambanan – um conjunto de templos dedicados a vários deuses hindus -.
Outra realidade a destacar na Indonésia é a necessidade de aprender a língua local. O Indonésio ou o malaio da Indonésia é vital para sobreviver no país, pois o indonésio médio não fala inglês. Para qualquer questão de rotina como apanhar o táxi ou ir às compras é necessário falar um mínimo de indonésio. Caso contrário, a pessoa está perdida. Literalmente, perdida e desamparada. O inglês não funciona como língua de comunicação, tirando o facto de algumas situações muito excecionais em que sim se fala, mas sempre nos círculos mais restritos. Em consequência, as conversas sem o bahasa tornam-se confusas e vagas e os mal-entendidos são muito comuns. Por exemplo, nos restaurantes a pessoa pede qualquer coisa e eles trazem uma outra diferente, ou nas lojas a pessoa pergunta por um produto e eles dizem que não o tem, quando na realidade sim, etc. Em resumidas contas, é necessário estar preparado para confrontar esta realidade – imutável por enquanto-.
Finalmente, em relação ao ponto anterior, gostaria de frisar a quantidade de palavras em português que ainda hoje são parte do vocabulário indonésio. Palavras como “meja” (mesa), “sepatu” (sapato), “queju” (queijo), “mentega” (manteiga), “pesta” (festa), “jendela” (janela), “sabun” (sabão) “lemari” (armario), “limau” (limão), etc.; são originais do português. Infelizmente, muitos indonésios nem sabem, mas usam-nas no quotidiano.
Susana de Valentin,
Esposa do Responsável Secção Consular de Portugal na Indonésia.
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